Já pensou em viver no fundo do mar? Em um futuro não tão distante, essa possibilidade pode se tornar realidade. A startup britânica DEEP está liderando um dos projetos mais ambiciosos da exploração subaquática: o Sentinel, um habitat submersível que promete levar seres humanos para morarem permanentemente a até 200 metros de profundidade no oceano.
Com previsão de lançamento até 2027, o projeto oferece uma nova fronteira para a vida humana, combinando inovação, ciência e sustentabilidade. Mas como funcionará esse habitat submerso? Quais são os prós e contras de viver debaixo d’água? E o que torna esse projeto tão importante para o futuro da humanidade e do planeta? Respondemos as suas dúvidas em seguida.
O que é o projeto Sentinel?
O Sentinel é um habitat modular e pressurizado, criado para permitir que civis e cientistas vivam, trabalhem e conduzam pesquisas no fundo do mar por períodos prolongados — até 28 dias seguidos. Desenvolvido pela DEEP (Deep Environment Engineering and Physics), o projeto, portanto, visa criar uma presença humana permanente nos oceanos até 2030.
A estrutura será construída inicialmente em uma antiga pedreira inundada no Reino Unido, com 600 metros de comprimento, 100 de largura e 80 de profundidade, proporcionando um ambiente seguro e controlado para testes.
A tecnologia usada no Sentinel é baseada em soldagem e impressão 3D avançadas, permitindo a construção de cápsulas robustas, seguras e personalizáveis.
Cada unidade do habitat contará com quartos individuais, banheiros, chuveiros, áreas sociais, espaços de trabalho e laboratórios equipados para análises genéticas e estudos de biodiversidade marinha. Além disso, a estrutura será alimentada por fontes de energia renovável, como cabos conectados à costa, fazendas flutuantes ou sistemas de baterias submersas recarregáveis.
Como o Sentinel vai funcionar?
O funcionamento do Sentinel envolve uma complexa engenharia de suporte à vida em ambientes extremos. O habitat poderá ser posicionado até 200 metros abaixo da superfície e manterá a tripulação em condições estáveis de pressão, temperatura e umidade.
A mistura respiratória usada dentro da estação terá 98% de hélio e 2% de oxigênio, devido às propriedades narcóticas do nitrogênio em grandes profundidades.
A estação contará com um sistema de energia reserva de 96 horas, garantindo segurança em caso de falhas técnicas. Para alimentação, suprimentos serão enviados periodicamente e o habitat poderá ser reabastecido por um sistema de conexão com boias na superfície.
Além disso, o Sentinel utilizará tecnologia de saturação — já aplicada na indústria de petróleo e gás — permitindo que os ocupantes permaneçam por longos períodos sem precisar subir à superfície para descompressão, o que tornaria o retorno perigoso.
Por que viver no fundo do mar?
A proposta do Sentinel vai muito além da curiosidade ou do luxo. Seu objetivo central é impulsionar a ciência oceânica e permitir uma nova forma de interação com os ecossistemas marinhos.
Atualmente, só é possível realizar trabalhos a 200 metros de profundidade por cerca de dez minutos, seguidos de seis horas de descompressão. Com o Sentinel, cientistas poderão realizar sete anos de pesquisas em apenas um mês.
Isso é especialmente relevante considerando que mais de 90% da biodiversidade marinha está localizada até os 200 metros de profundidade, e que os oceanos absorvem quase 25% do CO₂ emitido pelo homem e 90% do calor gerado pela atividade humana. Ou seja, compreender o funcionamento desses ecossistemas é essencial para combater as mudanças climáticas e preservar a vida na Terra.
Além disso, há um potencial inexplorado para descobertas biomédicas, minerais e ecológicas. O oceano é uma das últimas fronteiras desconhecidas do planeta — e o Sentinel poderá ajudar a revelá-la.
Os benefícios de morar no oceano
Entre os principais benefícios de morar no fundo do mar, destacam-se:
- Aceleração da ciência: pesquisadores poderão estudar o comportamento da vida marinha em tempo real, por longos períodos, sem interrupções.
- Conservação ambiental: a presença humana contínua nos oceanos pode ajudar a monitorar e preservar ecossistemas frágeis.
- Inovação tecnológica: o desenvolvimento de habitats como o Sentinel impulsiona avanços em engenharia, bem como na medicina hiperbárica, robótica e energias renováveis.
- Educação e conscientização: projetos como esse colocam o oceano em evidência e aumentam a compreensão pública sobre sua importância para o planeta.
- Exploração de novos modos de vida: viver sob o mar pode se tornar, no futuro, uma alternativa viável em resposta ao crescimento populacional e à crise climática.
Os desafios e limitações
Por outro lado, essa experiência não será para todos — pelo menos, não nos primeiros anos. O acesso ao habitat será restrito a cientistas, técnicos altamente treinados e, eventualmente, indivíduos com patrimônio líquido altíssimo, como explicou o presidente da DEEP, Sean Wolpert, comparando o projeto às viagens espaciais privadas da SpaceX e Blue Origin.
Além disso, viver a 200 metros de profundidade envolve riscos técnicos e biológicos. O ambiente é extremo e impõe exigências rigorosas em relação à ventilação, pressão, calor, controle de umidade e até à escolha de materiais, que não podem ser porosos ou emitir gases. Há também desafios elétricos, já que o hélio danifica componentes eletrônicos, exigindo a criação de circuitos específicos para ambientes saturados.
Outro ponto importante é o isolamento psicológico. Afinal, estar confinado em um espaço pequeno, submerso e isolado da superfície por semanas exige preparo mental, acompanhamento constante e ambientes cuidadosamente projetados para o bem-estar dos tripulantes.
O futuro da vida subaquática
O projeto Sentinel é apenas o começo. Antes dele, a DEEP testará o Vanguard, um habitat menor, com capacidade para até três pessoas, que servirá de base para testes operacionais em 2025. A expectativa é que, com o sucesso do Vanguard e do Sentinel, uma presença humana contínua nos oceanos seja estabelecida até 2030.
Em suma, essa visão de longo prazo inclui não apenas pesquisas científicas, mas também a possibilidade de que, no futuro, residências subaquáticas civis estejam disponíveis, abrindo caminho para uma nova era da vida humana no planeta — ou melhor, debaixo dele.
Apesar dos desafios técnicos e do alto custo inicial, o projeto representa um avanço significativo na exploração marinha e na adaptação humana a novos ambientes. A longo prazo, viver no oceano poderá ser uma das soluções para entender e mitigar os efeitos das mudanças climáticas, além de expandir os limites do que chamamos de lar.